A primeira quinzena de janeiro já se foi e muitos estão correndo atrás do prejuízo para conseguir pagar o que gastou com as festas de uma maneira irresponsável. Aqui na África, a mesma situação se repete. O problema do ser humano com a natureza caída é querer gastar mais do que pode, e isso tem causado enorme prejuízo para nós e para outras pessoas.

Recentemente, li em uma camiseta a seguinte frase: “Não tenha medo de ser missionário”. E ao refletir sobre aquela frase, me veio à mente muitos missionários que não “tiveram medo” de vir para o campo, mas que foram abandonados por suas igrejas e agências missionárias. Dois deles (um casal) precisaram morar conosco por mais de seis meses, pois a sua igreja simplesmente virou às costas para eles. O que fazer numa situação como essa? Será que eles poderão dizer aos seus filhos que não tiveram medo de serem missionários? Quem vai tratar dos traumas psicológicos que eles tiveram ao serem abandonados?

Continuei pensando sobre aquela frase, e lembrei-me de algumas missionárias que foram sepultadas aqui na Guiné-Bissau durante o tempo em que estamos servindo a Deus como missionários. Missionários devem ter medo? Continuei pensando e me veio à mente o dia em que nossos filhos, pequenos à época, Isabella e Breno, contraíram malária e Elaine orou para Deus prepará-la, pois não estava pronta para perdê-los. Mas Deus foi misericordioso e a cura veio. Como será o nosso regresso do campo quando nos aposentarmos? Digo isso, porque estamos absorvendo como uma esponja os costumes de outra cultura, como por exemplo, vendo meninas sendo dadas em casamento forçado, indo ao fanado sendo mutiladas e “castradas” por seus próprios familiares.

Será que a igreja que nos enviou vai nos entender quando preferirmos sentar numa esteira ao invés de cadeiras luxuosas? Será que os nossos parentes ou amigos que nos enviaram vão nos entender quando começarmos a falar de repente a língua dos africanos? Será que os amigos de nossos filhos os entenderão, quando eles preferirem momentos de isolamentos enquanto todos estiverem “hipnotizados” por um celular de última geração? Como as pessoas tratarão nossos filhos quando eles “preferirem” os biscoitos “mofados” de uma mercearia no interior da África ao invés de um biscoito de uma marca famosa? Ou chorar no Brasil por saudade do pão seco e duro do padeiro africano?

Os valores adquiridos no campo missionário são outros. A vida é dura. Amigos que estavam “ontem” conosco, de repente são levados para uma cerimônia (ritual de passagem) na mata e nunca mais retornam. O missionário precisa se envolver com o povo, comer com ele, sentar com ele. Mas na hora de partirmos do campo missionário, isso não pode ser arrancado do nosso coração. Jamais.

Estamos indo para o nosso 9º  período na Guiné-Bissau e já faz bastante tempo longe da nossa Pátria amada Brasil. Mas mesmo diante de tanta mudança, posso te dizer com toda certeza que vale a pena ser missionário. Algumas peculiaridades nós adquirimos nesta outra cultura, e espero que a igreja que nos enviou nos dê suporte e atenção quando voltarmos para casa.

Alguns não conseguirão superar a partida e a ausência do povo nativo, e acabarão se isolando e adoecendo. Mas precisamos avançar. E aquela frase “Não tenha medo de ser missionário” não vai mais sair da minha mente. Peço que ore por cada missionário que já está há bastante tempo no campo. Interceda por nossa família. Deixo uma reflexão especial aos irmãos que nos adotam ou são adotantes de outros missionários e projetos de Missões Mundiais: “Não tenha medo de investir na vida do missionário”. 

Freddy Ovando
missionário na Guiné-Bissau

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