artigo de Carmen Ligia Ferreira de Andrade (Missionária na Colômbia)

É apavorante o veredicto da Corte Suprema da Colômbia, feito ao final de agosto deste ano, no qual permite que menores entre 14 e 18 anos podem tomar a decisão de viver em “união livre”, precisando somente da autorização escrita dos pais para o casamento civil, que está expresso nos artigos 117, 118 e 140 do Código Civil da Colômbia. Essa medida deixa o adolescente, que ainda está em processo de desenvolvimento mental, social, físico e emocional, decidir formar uma família. São crianças dando à luz a crianças. Adultos se relacionando intimamente com crianças, com a autorização do governo. Um assustador passo para uma futura liberação da pedofilia. 

Segundo o último censo realizado, 31,02% da população, ou seja, 15.454.633 dos colombianos são meninos, meninas e adolescentes. E de acordo com os dados de 2020, publicados pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), 26% das mulheres na Colômbia começaram a viver em união livre antes de completar 18 anos¹. 

Quando pensamos no risco de que tantas crianças e adolescentes deixem de viver conforme sua idade e comecem a entrar no mundo adulto precocemente, assumindo responsabilidades para as quais ainda não estão preparadas, é assustador. É um caminho aberto para a exploração sexual de milhares de crianças e adolescentes em etapa de desenvolvimento e autoconhecimento. 

Elizabeth Florez, uma das líderes da Fundação PARE, projeto de Missões Mundiais, comentou: “Essa é uma decisão contraditória, pois em nosso país os casos de adolescentes grávidas e a prática da prostituição são alarmantes. Sem falar que o abuso e maus-tratos infantis é uma decisão que desprotege totalmente a criança e a cada dia a aproxima mais dos abusadores, que começam a ter mais liberdade.”  

A Organização Mundial da Saúde (OMS) indicou que anualmente no mundo, cerca de 16 milhões de meninas entre 15 e 19 anos dão à luz¹.   Na Colômbia, a taxa de gravidez na adolescência é de 19,5%, ou seja, uma em cada cinco adolescentes entre 15 e 19 anos é mãe ou está grávida². E todas as 13 mulheres que estão sendo discipuladas este ano na Fundação PARE em Medellín, confirmam que entraram na vida da prostituição antes dos 12 anos de idade.

Trabalhando com as crianças e adolescentes nas ruas de Medellín através do projeto “Vida en la calle”, da Fundação PARE, do PEPE (programa socioeducativo) e até mesmo ao aconselhar por meio do programa Bolsa Verde do Projeto Calçada, pude escutar muitas histórias tristes, ver lágrimas caindo sem parar entre soluços profundos e abraçar muitas crianças sem esperança de um amanhã, dizendo que ingressaram no mundo da prostituição ou que foram dadas por suas famílias para viverem com adultos quando ainda brincavam com bonecas e carrinhos.  

Mary, uma menina de 15 anos me disse: “Fui entregue para viver com esse homem quando tinha 11 anos e ele me dizia que podia continuar brincando com as bonecas, que ele não tinha nenhum problema com isso, contanto que continuasse servindo-lhe como mulher.”   

Diante de realidades como essas, é extremamente importante desenvolver um trabalho em defesa dos direitos da criança e do adolescente neste momento em que a própria lei está contra eles. A cada dia eles estão mais vulneráveis ​​e desprotegidos, sujeitos a abusos, prostituição infantil, exploração e vícios, por conta de um governo omisso e conivente, além da sociedade e das famílias que há muito tempo ignoram os seus direitos. 

Na Colômbia, Missões Mundiais tem trabalhado através dos missionários para levar esperança a essas crianças e adolescentes, porque cremos que todos têm o direito de um crescimento integral, como teve o nosso Salvador Jesus, relatado claramente em Lucas 2:52. Sendo ainda uma criança, ele desfrutava dos seus direitos junto aos pais podendo estudar, ter uma boa alimentação e aprender a viver na sociedade, respeitando a todas as pessoas e sendo respeitado por elas, e amando a Deus sobre todas as coisas. Digo tudo isso porque acreditamos que, quando uma instituição – seja ela governamental, religiosa ou familiar – tem clareza de que os direitos das crianças e adolescentes são essenciais, é possível proteger e resgatar vidas, contribuindo para a sociedade ao possibilitar que se tornem adultos com valores que lhes permitam tomar boas decisões e não repetir a sua história de vida. 

Conscientizar os adultos sobre a responsabilidade de cuidar e proteger as crianças tem sido a nossa meta em todos os programas que desenvolvemos na Colômbia, isso porque entendemos que, quando essa conscientização é feita em equipe há mais chances de sucesso, unindo instituição e família, pois ambas as partes cumprem papéis importantes no desenvolvimento da personalidade desses menores. Esse é um trabalho que, sendo guiado com base nos direitos das crianças e dos adolescentes, desenvolve de forma satisfatória o físico, o intelectual e o emocional delas, porque busca seu bem-estar integral. Uma das bases é fortalecer a criança e o adolescente dando-lhes ferramentas que lhe permitam, na prática, fazer uso de seus direitos. 

É um grande desafio, mas podemos vencer esse "Golias" ao exercer o nosso papel de cristãos. Não somente orando, mas também protegendo todas as crianças que os nossos braços espirituais e físicos podem alcançar. 

   

Referências:

¹ https://legadosolidario.unicef.org.co/conecta-con-unicef/panorama-ninas-ninos-colombia

²  https://scp.com.co/editorial/embarazo-en-adolescentes-problema-de-salud-publica-creciente-en-colombia/